BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Militares do Mali amotinados desde a manhã desta terça-feira (18) detiveram o presidente, Ibrahim Boubacar Keita, e o primeiro-ministro do país, Boubou Cissé. Ainda não há informações se há acusações formais contra a dupla e também não está claro quem está no comando do país no momento. Durante a tarde, a televisão estatal ORTM foi tirada do ar. Segundo o grupo de oposição M5-RFP , que tem liderado protestos pedindo a renúncia de Keita e Cissé desde 5 de junho, o que está ocorrendo no Mali “não é um golpe militar, mas uma insurreição popular”. O motim se iniciou na base militar de Kati, a 15 quilômetros da capital Bamako. Segundo a embaixada brasileira em Bamako, “houve tiros dentro da base” e o comércio foi fechado devido ao temor de um golpe de Estado. Com a tomada da base, somada aos rumores de uma possibilidade de um golpe em curso e a informações de que ministros e militares de alto escalão teriam sido detidos pelos amotinados, milhares de pessoas saíram às ruas do centro da capital para comemorar. Imagens da agência AFP mostram caminhonetes de militares sendo recebidas com festa pelos manifestantes. Presidente da União Africana, o etíope Moussa Faki Mahamat, disse condenar “energicamente a prisão do presidente” malinês e dos outros membros do governo e “pediu sua liberação imediata”. “Condeno veementemente qualquer tentativa de mudança anticonstitucional e apelo aos amotinados para que cessem todo o uso da violência e respeitem as instituições republicanas”, escreveu Faki no Twitter. A base de Kati é a mesma onde teve início um golpe militar que, em 2012, derrubou o então presidente Amadou Toumani Toure gerando a instabilidade que abriu espaço para que radicais islâmicos assumissem o controle de vastas regiões no norte do Mali e em países vizinhos. Os conflitos na região persistem desde 2012, com a presença de uma coalizão internacional liderada pela França. Esse é um dos motivos pelo qual os líderes do país vem sendo pressionados a renunciar desde junho, quando grandes protestos tomaram as ruas de Bamako, deixando ao menos 14 mortos. Os manifestantes reclamam da corrupção no governo e da ineficiência da coalizão que tenta combater os extremistas islâmicos há oito anos. Quem lidera os protestos é o grupo de oposição M5-RFP –cujo nome faz referência ao dia 5 de junho, data de início dos protestos– e o clérigo muçulmano Mahmoud Dicko. Apesar de os protestos serem heterogêneos, com pessoas de diversos grupos religiosos e políticos, Dicko é visto como a força que galvanizava os atos –ele ainda não se pronunciou sobre os acontecimentos desta terça. A importância estratégica do Mali para o conflito na região do Sahel torna a instabilidade no país um motivo de preocupação para as nações vizinhas e para a comunidade internacional. O temor que isso possa prejudicar a luta contra grupos extremistas islâmicos que protagonizam conflitos na região oeste do Sahel –faixa de clima semi-árido abaixo do deserto do Saara e acima da floresta tropical africana. A Cedeao (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental) tentou apaziguar a situação no Mali em três oportunidades. Na última, após uma conferência extraordinária com todos os Estados-membros, o bloco fez uma série de recomendações para pacificar a oposição e os manifestantes. O governo tentou colocar as recomendações em prática, mas a oposição não cedeu e seguiu pedindo a queda de Keita e seu governo. Antes da confirmação sobre a prisão dos líderes do país, o embaixador brasileiro para o Mali, Rafael Vidal, afirmou à reportagem que o governo brasileiro segue apoiando a “ordem institucional” e o “presidente legitimamente eleito do país, Ibrahim Keita”. Segundo ele, “Keita tem sido hábil negociador e tem obrado duro pela estabilidade política, preservação da democracia e retorno da segurança na luta contra o terrorismo”. Keita foi eleito presidente em 2013 e reeleito em 2018.