Na pandemia, disputa de legado na saúde marca fala de pré-candidatos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Fora do comando da máquina pública, ex-prefeitos que disputarão as eleições municipais em novembro tentam pegar carona nas ações de enfrentamento à pandemia ao valorizar um legado deixado na saúde, em uma estratégia tanto em São Paulo como em municípios da região metropolitana. A capital paulista, que fechou a primeira quinzena de agosto com uma média diária de 3.217 novos casos e 79 óbitos, segundo dados compilados pela plataforma Brasil.io, conseguiu reduzir a taxa de ocupação de leitos de UTI e tem avançado no processo de reabertura das atividades, criticado por oponentes. Entre os críticos do prefeito Bruno Covas (PSDB), que busca a reeleição, está o ex-governador Márcio França (PSB), que à reportagem resumiu as ações de enfrentamento à crise na cidade como “bateção de cabeça” entre Covas e o governador João Doria (PSDB). Na chapa do PSOL, que tem como vice de Guilherme Boulos a ex-prefeita Luiza Erundina (1989-92), além das críticas ao modelo de OSs (organizações sociais de saúde), haverá o resgate de ações deixadas por ela, como a construção de seis hospitais e a implementação do SUS na capital. Erundina foi prefeita pelo PT, por isso seus feitos também devem aparecer no discurso eleitoral do pré-candidato da sigla, Jilmar Tatto, segundo o coordenador de campanha e presidente do partido na cidade, Laercio Ribeiro. “Entendemos que a gestão é do partido, e não de uma figura A, B ou C”, afirma. “Só no governo do [Fernando] Haddad, por exemplo, para não falar das demais, foram entregues 294 novos leitos na cidade, quando a nossa meta era de 250”, diz, destacando a construção de UPAs (Unidades de Pronto Atendimento), UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e a reabertura do Hospital Vila Santa Catarina, na zona sul –que era privado e foi comprado e reformado pela prefeitura, um modelo que o partido quer repetir. “Ninguém pode achar que vai ganhar a eleição só defendendo legado e falando do passado. Não sabemos como vamos sair da pandemia e precisamos olhar para essa cidade do futuro.” Petistas que tentam desbancar adversários nas cidades vizinhas à capital paulista repetem o discurso sobre legado na saúde. Em maio, quando São Bernardo apareceu como segunda cidade menos vulnerável à Covid-19, num índice elaborado pelo Instituto Votorantim, Luiz Marinho, que foi prefeito por dois mandatos e no início de julho foi oficializado como pré-candidato do PT, já destacava o conjunto de obras deixado por ele, que inclui um hospital e nove UPAs. A cidade de 812 mil habitantes viu o número de casos crescer com o processo de flexibilização em julho, atingindo média de 499 novos casos no dia 28. Desde então, porém, tem mantido trajetória de queda, fechando a primeira quinzena de agosto com média de 226 novos casos e 4,4 mortes diárias, num total de mais de 19,5 mil casos e 694 mortos. Numa live no dia seguinte, ao lado do ex-ministro da Saúde Arthur Chioro, que foi secretário municipal na gestão do petista, Marinho acusou o atual prefeito, Orlando Morando (PSDB), de desmontar a gestão criada por ele. O tucano tem evitado se pronunciar sobre a campanha, mas não deixa de destacar feitos na saúde nas redes sociais, como a construção de dois hospitais e a contratação de profissionais. Segunda maior cidade do estado, com 1,35 milhão de habitantes, Guarulhou viu a média de novos casos ultrapassar 200 em junho e oscilar desde então –fechou a quinzena com mais de 14,6 mil casos acumulados e 1.149 mortes. O ex-prefeito e pré-candidato Elói Pietá (PT) tem feito vídeos críticos à gestão do candidato à reeleição, Gustavo Henrique Costa (PSD), o Guti. Pietá aponta falta de insumos e profissionais, além de criticar a construção de um hospital de emergência num espaço provisório, em vez de equipar o prédio do Hospital da Mulher, segundo ele vazio, para fazer o atendimento. A campanha de Guti diz que não houve tempo hábil para isso e que as críticas do PT não têm fundamento, além de acusar o partido de ter deixado dívidas e sérios problemas de infraestrutura, principalmente na área de saúde. Pietá deve repetir a estratégia usada na campanha à deputado federal em 2018, em que destacou feitos na área, na gestão de 2001 a 2008, como a construção do Hospital Pimenta Bonsucesso e de outros, uma obra que Guti diz ter sido entregue inacabada. Em Osasco, o deputado estadual pelo PT Emidio de Souza é pré-candidato à prefeitura, comandada por ele de 2005 a 2012. A cidade de mais de 680 mil habitantes teve uma aceleração no número de casos em abril e passou a média de 130 novos casos por dia e 4,1 novas mortes na primeira quinzena, num acumulado de mais de 11 mil casos e 670 mortes. A campanha de Emidio diz que o prefeito Rogério Lins (Podemos) não soube usar a estrutura deixada por ele, como a criação de leitos, construção de três UPAs, um pronto-socorro e 15 UBSs. Em maio, antes mesmo de ser confirmado na disputa, o deputado destacou nas redes uma doação de R$ 500 mil para a cidade enfrentar a doença. O recurso teria sido resultado da articulação dele junto ao deputado federal Rui Falcão (PT-SP), afirmou. Lins rebateu destacando ações de sua gestão, como a criação do hospital de campanha e da criação de novos leitos de UTI durante a pandemia, mas diz que não deseja politizar o assunto. A ação no Legislativo em benefício da base eleitoral também tem sido adotada pelo deputado federal Marco Bertaiolli (PSD-SP), que não confirmou se será pré-candidato a prefeito de Mogi das Cruzes, que governou de 2009 a 2016. Com cerca de 433 mil habitantes, a cidade, que no final de junho ultrapassou a média de 50 casos diários, com o processo de reabertura fechou a primeira quinzena quase dobrando essa marca, com média de 96 novos casos diários da doença e 3,6 mortes diárias, num total de mais de 5.000 casos e 282 mortes. Nas redes sociais, o deputado tem destacado ações para liberar recursos para o enfrentamento à pandemia na cidade, como a doação de dez respiradores, além de relembrar a inauguração do primeiro hospital municipal durante a gestão dele. Para a campanha do prefeito e candidato à reeleição, Marcos Melo (PSDB), a estratégia de Bertaiolli é natural e deve ser amplamente utilizada na campanha. Ações mais restritivas adotadas pelo tucano no início da pandemia, como o fechamento das feiras livres na cidade, foram criticadas, mas a expectativa é a de que o equilíbrio da crise na cidade reverbere nas urnas a favor do prefeito.

Deixe um comentário