Santos teme que novas crises política e financeira influenciem em campo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há cerca de duas semanas, o presidente do Santos, José Carlos Peres, recebeu oferta de auxílio financeiro. Um conselheiro o procurou e se colocou à disposição para ajudar o clube num momento em que as dívidas se acumulam, não é possível registrar novos jogadores e os direitos de imagem do elenco estão atrasados em cinco meses. Esse resumo é contado da mesma forma por aliados e oposicionistas do cartola, mas a partir daí há divergências. Adversários dizem que Peres recusou a oferta com o argumento de que, quando o zagueiro Lucas Veríssimo fosse vendido, ele liquidaria todas as pendências. “Não foi nada disso. Eles vieram com uma proposta de emprestar R$ 10 milhões ao Santos desde que eu renunciasse ao cargo. Isso não vai acontecer. Não vou renunciar”, afirmou o presidente à reportagem. No meio de mais uma crise está o medo de uma campanha ruim no Campeonato Brasileiro. O time tem um ponto conquistado nas primeiras duas rodadas e neste domingo (16), às 19h45, recebe o Athletico. Após o reinício do futebol, paralisado por quatro meses por causa da pandemia, o Santos ainda não venceu em campo. Fora dele, perdeu o goleiro Everson e o atacante Eduardo Sasha por atraso nos salários. O atacante Yuri Alberto foi para o Internacional. “É sempre o mesmo desespero, para pagar conta do cotidiano. É vender almoço para pagar a janta”, reclama o vice-presidente Orlando Rollo, rompido politicamente com Peres desde o terceiro mês do mandato, iniciado em dezembro de 2017. Conflitos políticos não são raros no Santos. Dos quatro presidentes que o clube teve na década, dois foram expulsos do quadro associativo: Odílio Rodrigues Filho e Modesto Roma Júnior. Odílio entrou na Justiça e obteve decisão para ser reintegrado. Luis Alvaro Oliveira Ribeiro renunciou por motivos de saúde em 2014, quando sua administração já era um mar de problemas. “Eu não fui comunicado de nada sobre expulsão. Quando for, vou apresentar minha defesa”, afirma Modesto. Peres também corre o risco de sanções administrativas depois de dois anos seguidos com as contas rejeitadas pelo conselho deliberativo. Ele já enfrentou um processo de impeachment, reprovado em assembleia de sócios em setembro de 2018, mas ainda pode encarar mais uma votação para tirá-lo do poder. Por causa de uma dívida de R$ 16 milhões com o Hamburgo (ALE) pela contratação do zagueiro Cleber Reis, o Santos está proibido pela Fifa de registrar novos atletas. A pena pode ser aumentada porque o time brasileiro não pagou US$ 3,4 milhões (R$ 18,3 milhões) ao Huachipato (CHI) pela aquisição de Soteldo. Questionado sobre um cenário que para seus adversários é preocupante, Peres muda o tom de voz. Diz ficar revoltado com afirmações como a de que o Santos está quebrado. “Nós não estamos quebrados. Pagamos 30% dos salários durante a quarentena e agora vamos devolver uma diferença. O Santos não está morto!”, declara. O endividamento foi de R$ 353 milhões (corrigidos) em 2010 para R$ 440 milhões no ano passado. Na gestão de Peres, houve aumento exponencial das despesas, que raramente não superaram toda a arrecadação. “Os maiores impactos negativos nas contas são folha salarial, encargos e direitos de imagem. Com Peres, esses custos e despesas ultrapassam as receitas”, diz Carlos Aragaki, sócio da auditoria BDO, que consultou balanços anuais do time (desde 2006) a pedido da reportagem. Logo em seu primeiro ano de mandato, o Santos registrou déficit de R$ 77,3 milhões (vinha de lucro de R$ 2,9 milhões em 2017 e R$ 54 milhões em 2016). Só conseguiu obter superávit de R$ 23,5 milhões em 2019 graças ao lançamento contábil da transferência de Rodrygo para o Real Madrid. O clube registrou no ano passado arrecadação de R$ 215 milhões com negociações de atletas e repasses de mecanismos de solidariedade. A de Rodrygo representou R$ 172 milhões. Enquanto isso, a diretoria teve despesas de R$ 376 milhões, um recorde. Quando apresentados aos números, a reação de Peres é dizer que tem pago pago contas. Ele afirma terem sido mais de R$ 80 milhões desde que assumiu. “Eu passei três anos arrumando a casa. Quem vier depois de mim vai pegar uma situação bem mais tranquila”, se queixa o presidente, que sustenta não ser candidato à reeleição, em dezembro. A crise política que parece sem fim poderia ser debelada com resultados em campo. Nem isso tem acontecido. Se não for campeão na atual temporada, o clube entrará no maior jejum de conquistas desde o título brasileiro de 2002. Serão quatro anos de seca. A equipe foi vice-campeã nacional no ano passado, mas o crédito foi colocado na conta do técnico argentino Jorge Sampaoli, hoje no Atlético-MG. O elenco tem convivido também com reclamações de jogadores por atraso de salários e direitos de imagem. Após a eliminação no Paulista deste ano para a Ponte Preta, Peres demitiu o técnico português Jesualdo Ferreira e contratou Cuca, com quem teve vários conflitos quando este trabalhou na agremiação pela última vez, em 2018. Nenhum apelo ou crítica parece abalar o presidente, eleito porque soube se colocar acima de correntes políticas. “Quem quiser o meu lugar tem de ganhar a eleição. Eu só renunciaria se tivesse roubado o clube, e isso nunca aconteceu. As más gestões estouram sempre na última, e a última é a minha. Tenho confiança nesse time. O Santos não vai cair. O Santos é uma fênix”, finaliza o presidente.

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